Por que estudar e falar de determinado assunto? Por que criar um blog? Por que fazer mestrado? Por que criar um blog justamente no momento de escrever a dissertação de mestrado? Por que priorizar determinadas escolhas em detrimento de outras? Tenho inúmeras respostas para tentar explicar os caminhos da minha vida. Frequentemente essas respostas me remetem à influência de pessoas queridas que se ligam a mim a partir de sonhos, medos, momentos de indecisão, conquistas, algumas tristezas e muitos sorrisos e alegrias vida afora. Ah! Que lista imensa poderia fazer aqui só para citar essas pessoas nesse blog que timidamente vou construindo. Mas, nesse momento, quero escrever sobre alguém que não me conhece. Nunca sequer nos vimos. Mas , nas suas palavras escritas, ela se fez especial pra mim.
Meu encontro com seus textos não pode ser precisado. Da época de ensino médio, por indicação de um amigo, me tornei leitor do extinto site “no.com.br”. Acompanhei com pesar o aniquilamento desse site para, algum tempo depois, vibrar com a descoberta do “nomínimo”, um site (que infelizmente também saiu do ar) que surgiu como um alento aos antigos leitores órfãos do “no”. E foi nessa época, já nos primeiros anos dessa década, que comecei a ler, atraído pelos assuntos abordados, as colunas, e depois os posts, da jornalista Carla Rodrigues no site “nominino”. Os seus textos, que falavam de comportamento, artes, tv, tecnologia, sexo, filosofia, cinema, poesia..., alimentaram várias conversas de bar, me despertaram para leituras e ampliaram o meu olhar para ângulos, detalhes e assuntos que antes me eram indiferentes.
Entre março e abril de 2004, já no penúltimo ano do curso de Educação Física, eu estava em busca de um tema de pesquisa para escrever um projeto e concorrer à renovação de uma bolsa de iniciação científica. Meu orientador, amigo e grande parceiro nessa vida, Silvio Ricardo da Silva, sob a justificativa de que eu tinha dificuldade (comprovada) de tomar decisões, me delegou toda a responsabilidade da escolha do tema de pesquisa: um exercício para minha formação que me renderia várias noites em claro.
Numa dessas madrugadas passadas na rede em busca de uma luz para o tal projeto, surgiu a Carla Rodrigues com uma série de resenhas de livros reunidas sob o título de “Na pós-Internet, o pós-sujeito” (05/04/2004). Foi o gatilho para minha aproximação com a cibercultura! Quatro dias virados e eu tinha um projeto que buscava entender a influência das tecnologias sobre as brincadeiras de crianças e jovens. Foi assim que passei a ter uma relação de cumplicidade com a Carla Rodrigues, uma estranha tão familiar que se apresentava e se materializava nas linhas da tela de um monitor.
O desenrolar desse projeto me aproximou do mestrado. Ingressei em 2006 no Programa de Pós-Graduação em Educação Física da UFSC e passei a participar do Observatório da Mídia Esportiva, um grupo que busca entender e tratar pedagogicamente os sentidos/significados construídos pela mídia sobre as diversas manifestações de práticas culturais de movimento. Eu estava atento para as relações entre a tecnologia e o cotidiano quando novamente me surgiu a tal da Carla, a Rodrigues, e um de seus textos. Era novembro do ano passado e ela me surpreendeu com um post no seu blog “Contemporânea” (nominimo) que trazia um título enfático: “Não está gostando dessa vida? Tente outra…” A notícia relatava uma reportagem da CBS News intitulada, por sua vez, com o questionamento: “Is Virtual Life Better Than Reality? Os dois textos curtos apresentavam o Second Life (SL), um universo tridimensional (3D) digital on-line que prometia a possibilidade de realizar-se de uma forma que a vida real não oferece. O SL era completamente desconhecido por mim e me deixou perplexo. Eu ainda não sabia, mas a Carla estava, mais uma vez, dando a dica para as minhas escolhas pela vida.
Alguns meses depois, apresentei o Second Life, a partir do texto da Carla, para o professor Giovani de Lorenzi Pires, meu co-orientador no mestrado. Foi esse gaúcho do Alegrete, um dedicado cara de grande coração, que me disse pela primeira vez que eu devia e podia estudar o SL. Era uma vontade que eu tinha ainda tímida, mas que eu pensava ser inviável dentro da especificidade da Educação Física. Sai radiante daquela reunião. E com uma gratidão e carinho crescente e explícito pela estranha familiar que eu lia na rede.
Por muito tempo a Carla não teve rosto. Também não tinha um timbre de voz. Eu não imaginava sua idade, altura, cor de pele. Ela era uma miscelânea de textos e assuntos que me emocionavam, provocavam, ensinavam, divertiam. Até que um dia seu livro sobre o Betinho começou a ser divulgado. Carla ganhou na minha mente uma pequena biografia, depois um rosto em uma foto. Foi então que eu parei toda a casa com um acontecimento. A Carla Rodrigues, de quem eu tanto falava, podia ser vista em um vídeo na Internet!!! Era uma entrevista no projeto Sempre um Papo falando sobre o seu livro. A Carla ganhou voz, gestos, histórias, expressões na face, sorriso, um corte de cabelo. Ela transparecia emoção, pela primeira vez, para além das suas palavras escritas.
Há alguns anos eu ensaio para escrever essas linhas. Tanto ensaio para agora me valer do improviso. Pela primeira vez tenho coragem de escrever para Carla. A minha leitura da escrita cotidiana dela na rede foi fundamental para que eu tivesse a vontade de criar um blog. Por isso, a essa pessoa especial, quero desejar o blog Ilhas Desconhecidas. É um agradecimento por ela me acompanhar na minha trajetória.
* Quem quiser saber mais sobre a Carla Rodrigues e ler seus textos, acesse o blog da jornalista aqui.