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segunda-feira, 12 de novembro de 2007

A tecnologia no cotidiano II

O site Guia Floripa, que disponibiliza a agenda cultural e as possibilidades turísticas da cidade de Florianópolis – SC, ao descrever um "tradicional point da juventude da ilha", a Praia Mole, ressalta que “nos dias mais quentes a paquera toma conta do lugar. Corpos atléticos e torneados desfilam por suas areias, exibindo todo o charme de quem sabe aproveitar as coisas boas da vida”. Entre os corpos esculturais que transitam pela característica areia fofa da praia, um olhar mais atento se surpreende com a dinâmica de inteiração social da juventude que ocupa aquele espaço. Tanto a ostentação da beleza estética explicitada no ideal do corpo perfeito quanto a busca pelo contato corporal com a natureza convivem com práticas que advém das novas tecnologias e estabelecem uma cena que parece contraditória.

Os corpos perfeitos que dividem o mesmo espaço na areia se perdem em um ritual individual e solitário que se volta para as músicas executadas em um tocador de MP3. Por horas consecutivas não há diálogo com quem divide a faixa de areia. O mundo exterior ao sujeito parece fragmentado, suas partes são selecionadas e isoladas de acordo com o interesse particular: sai o que (ou quem) for inconveniente, ficam a areia, o sol e o mar. Já não há contentamento com uma exuberante paisagem natural. A paisagem deve seguir a lógica de um videoclipe onde as imagens são sempre acompanhadas por uma trilha sonora.

Na outra extremidade da situação, o visual “roupa de banho, óculos escuros e chinelo de dedo” ganha a companhia dos celulares. Mais uma vez os ocupantes da praia não convivem entre si. Perdem-se em um mundo de conexões de alcance incalculável Os celulares aproximam quem está distante e afastam quem está próximo. A praia lotada abarca, além das relações tradicionais e dos corpos perfeitos, centenas de pessoas que estão transitando ou por uma realidade própria e solitária ao som da música que não é compartilhada com a pessoa ao lado, ou pela conversa que se estende por um mundo alheio e distante da praia a partir da telefonia móvel. Como entender os usos da tecnologia em um ambiente onde o corpo é exposto e sobrevalorizado? O corpo é reificado na busca pela estética do belo, é cultuado como mais um acessório que se ostenta no ambiente da praia? Ele é anulado, esquecido, torna-se um corpo diluído pela imersão no ambiente tecnológico? Ou ampliado em possibilidades, tendo nos aparatos tecnológicos a extensão e ampliação dos seus sentidos?

Em um fim de semana de sol, ao andar pela Praia Mole lotada, vemos inúmeros corpos belos e sarados. Um desfile de sungas e biquínis revela tatuagens estampadas em curvas e músculos perfeitos. Pessoas conectadas por celulares conversam remotamente por voz, trocam mensagens instantâneas, guardam suas imagens digitalmente e até se banham no mar de vez em quando. Se não fosse pelas horas de musculação e ginástica, pelos tratamentos de beleza sofisticados, pelas cirurgias plásticas evidenciadas pelos implantes de silicone, por um ou outro ciclo de durateston (esteróide injetável que combina 4 ésteres da testosterona) e pelo fato de ninguém passar voando, eu até pensaria que aquelas pessoas são avatares em uma ilha do Second Life. Avatares que exibem corpos imaginados cheios de perfeição editados em uma ferramenta 3D e que escolhem se vão interagir usando o recurso de voz ou o chat. Não resisti à comparação.


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